Foi em uma noite tranquila de 2015, como de costume, toda a família tradicional Angolana em casa, reunidos de frente a TV, que, pela primeira vez, em toda a história da TV Angolana, foi transmitido o primeiro beijo Gay em uma telenovela nacional, e, em um canal público… Nem mesmo a comunidade LGBT estava preparada para tal acontecimento!
Jikulumesso, título da novela em pauta, foi um grande divisor de águas na luta da comunidade LGBT pelos seus direitos em Angola naquele ano e em diante.
Como era de se esperar, a transmissão do primeiro beijo entre dois homens em uma Telenovela Angolana, causou um grande impacto e severas discussões sobre a Homossexualidade em todo o país, chegando a ser suspensa no dia seguinte a transmissão da novela em todo o território nacional, durante aproximadamente uma semana.
No dia seguinte, após o grande acontecimento, instaurou-se longos debates nas redes sociais e em praticamente todos os canais de média social. Lideres religiosos e até mesmo juristas, reprovaram severamente a transmissão de uma representação de Homoafetividade. Sendo que, uma boa parte da população Angolana demonstrou um grande descontentamento pelo sucedido, criticando arduamente a produtora da novela.
Como era de se esperar, vários foram os portais de notícias e articulistas que publicaram notas de repúdios pela transmissão de um SIMPLES BEIJO Homoafetivo.
“A ousadia de Coréon Dú”, foi assim que um (possivelmente) jornalista intitulou o seu artigo para repudiar tal acontecimento. “Há muito tempo que venho através deste portal de notícias denunciar a intenção do Sr. José Paulino dos Santos, de colocar uma mordaça pública sobre o homossexualismo, através da Semba Comunicações e usando e abusando da influência e o poder que seu pai tem” Escreveu o articulista.
De longe, Coréon Dú foi a figura mais criticada e apedrejada no meio de todo esse alvoroço, por ter sido o produtor da novela, criador da empresa que produziu a novela, e, principalmente, por ser Homossexual. Mesmo que na época Coréon Du não tivesse assumido a sua orientação sexual, já se ouvia nos corredores da TV os questionamentos sobre a sua orientação sexual.
Para o ator, Pedro Hossi, interprete do personagem Carlos Nambe, que protagonizou junto com o ator Lialzio Almeida (Gerson Cange Gonçalves) o polemico beijo Gay, na época a reação de descontentamento e discursos de raiva de uma parcela do publico o deixou assustado.
– Assustei-me com a violência dos discursos. Não esperava que a cena levaria a uma polémica tão grande, e acho que ela que ela precisa ser bem conduzida. É preciso promover um diálogo saudável sobre a diversidade, sem extremismo.É triste que a confusão tenha culminado com a censura da novela… Não cabe a mim julgar o personagem. Só quero contar uma história, e o beijo era importante porque avançava a história de amor entre os dois – explicou o ator em entrevista.
Lialzio Almeida, demonstrou apenas temer ser julgado pela sociedade, sendo que, a orientação sexual do personagem tornou-se mais fácil de ser interpretada pelo mesmo ter estado solteiro na época.
Já para Coréon Dú, produtor da novela, em recentes declarações, a reação da sociedade no geral concernente ao beijo o deixou indignado e admirado, sendo que na altura, assuntos sobre a Homossexualidade já não eram tabus na sociedade Angolana.
“Tivemos de editar as cenas, retirando as cenas românticas… Fiquei confuso como as pessoas criticaram pelo fato de ter personagens Gays, mas ficarem tristes porque os personagens Gays não tiveram um final feliz. A novela voltou a pedido dos mesmos” frisou o produtor.
Como qualquer moeda, enquanto uma boa parte da população Angolana reprovou a novela, a comunidade LGBT vibrou de alegria quando viram pela primeira vez na TV Angolana a transmissão de um beijo Gay. As redes sociais se encheram de manifestos de alegrias e agradecimentos por de alguma forma a empresa de Coréon Du conseguir transmitir um ato de Homoafetividade na televisão pública de Angola… Foi um ato de revolução e representatividade que, nem nos nossos sonhos mais coloridos seriamos capazes de o vislumbrar.
Hoje, olhando para o passado recente de um dos canais de TV público em Angola, percebemos o quão revolucionário e representativo foi a gestão da Semba Comunicação nesse canal. Pois, foi com a gestão da mesma que pela primeira vez na história da TV Angolana, tivemos a oportunidade de ver uma repórter Transexual a fazer trabalho de reportagem para um canal público (Hady Lima, que na época se apresentava como uma pessoa Gay afeminada).
Quem não se lembra de 2011, quando a Titica fez história ao se apresentar para o ex-presidente da república de Angola, José Eduardo dos Santos, na premiação Divas Angola transmitida pelo canal que estava sob gestão da Semba Comunicação?
Tivemos o início Dourado para a comunidade LGBTQIAP+ na TV Angolana, onde Coréon Dú apertou o Play da inclusão, e, a transmissão do beijo Gay foi apenas o ápice da revolução. Foi uma revolução que precisou se passar anos para percebermos que estava a acontecer…
Há uma clara ignorância cronica e opcional por parte da população Angolana, dos seus líderes e influencers em respeitarem e aceitarem a integração das pessoas LGBT nos seus locais sociais e políticos de direito.
Pessoas LGBT em posição de destaque precisam usar os seus privilégios para incluir e emancipar outras pessoas LGBT em Angola. Seus atos são de extrema importância na luta pelos direitos da comunidade LGBTQIAP+ em Angola.
Por David Kanga