Com certeza, falar de Feminismo hoje é trazer várias problemáticas a tona. Problemáticas que muitas das vezes não fazemos ideia da sua existência… Desde a emancipação da figura feminina, ao direito de ir e vir, e, ter a sua liberdade sexual respeitada e protegida.
Gosto de usar como exemplos a escritora Chimamanda Ngozi Adiche e a cantora Beyoncé, por terem uma grande influência perante a geração Z, e, por trazerem nos seus trabalhos percepções e definições simples de se entender sobre ”O Que é o Feminismo?”… Enquanto que no seu livro, Chimamanda diz “Feminismo, pessoa que acredita na igualdade social, política e económica entre os sexos”, Beyoncé durante a sua entrevista para a revista Elle diz “Se vocé é um pai que acredita que a sua filha tem de ter os mesmos direitos e oportunidades que o seu filho, vocé é feminista”.
É obvio que a luta de ambas têm ramificações diferentes, pois enquanto uma por exemplo, luta para a mulher Nigeriano não ser catalogada como trabalhadora de sexo quando entra em um restaurante, a outra luta para que a mulher Norte Americana tenha a sua liberdade sexual respeitada e protegida… Mas, e no contexto Angolano?
Como temos catalogado o Feminismo na sociedade Angolana juntamente com a causa LGBTQIAP+?
Falar de Feminismo em Angola é preciso tirar os sapatos, sentar no chão e explicar para as nossas mães, irmãs, pai e irmãos que, tarefas domésticas não é algo exclusivo para as mulheres, pois como é óbvio, todos os elementos da família contribuem para a desorganização/sujeira da casa. É preciso fazer entender aos nossos irmãos, pais e mães que, não pode existir louças exclusivas para o pai. É preciso fazer entender que, o melhor pedaço da galinha/do peixe deve ser para as crianças que estão em fase de crescimento, e, precisam ter todos os nutrientes possíveis para fortificar a sua saúde… E ainda, é preciso parar de encutir nas meninas que o ápice de suas vidas é conseguirem ter um marido com bom emprego, casa e filhos, e, se não terem marido elas não terão a vida realizada… Não é que “esteja errado” as mulheres desejarem essas coisas. Mas por que temos que passar essa mensagem as mulheres e aos homens não? Será que toda mulher quer ser dona de casa? Será que toda mulher sonha em casar?
Minha mãe tem 56 anos, 5 filhos e há 23 anos que não tem marido. Criou e educou os seus 5 filhos sozinha, construi um lar para ela e os seus 5 filhos sozinha, tudo isso fruto da refeição que ela vendia na praça. Não foi nada fácil para ela conseguir isso, foi extremamente difícil. Será que, se ela tivesse as mesmas oportunidades e credibilidade que é dada aos homens Cis Heterossexuais, ela iria passar por tantas dificuldades como passou? Será que, se um homem Heterossexual Cis estivesse no lugar dela iria aguentar ou passar pelas mesmas dificuldades que ela passou?
Essa é a realidade da minha mãe, da tua mãe, da mãe dele e das mães de muitos outros filhos Angolanos que, por culpa do sistema, são abandonadas, marginalizadas e obrigadas a serem maquinas de procriação.
E os homens? A mensagem que lhes é passada sobre o ápice de suas vidas é extremamente diferente, pode acreditar.
Vemos que, a problemática que recai sob as mulheres em Angola ainda é muito de base, é cultural e alimentada por políticas opressoras.
Feminismo Radical na nossa realidade
Recentemente uma serie de farpas e ataques foram trocadas entre um grupo de mulheres que se autodenominam “Feministas Radicais”, e, Activistas LGBTQIAP+ Angolanos. Tudo devido a uma publicação (no Facebook) de uma das Feministas Radicais que dizia, “Feminismo é para todas as mulheres. Nenhum homem que use vestido, se autodenomine MULHER e se chama Margarida tem voz aqui. Também não é para Gays… O Feminismo não é clube de diversidade de pilas. Feminismo é por e para mulheres”.
Um autêntico discurso de ódio e Transfobia contra as Mulheres Trans, e, um ato de sexismo e objetificação da mulher Cis, resumindo a sua existência ao orgão genital.
O que é ser Mulher?
O que são Gêneros?
Definitavamente ser mulher não se resume em ter biologicamente uma vagina, é algo que vai muito além disso. Pois, ninguém nasce Mulher, Homem ou Queer, nós crescemos e com base na sociedade em que nos encontramos, nos tornamos Mulheres, Homens ou Queer. Pois, ser Mulher, Homem ou Queer acaba por ser uma identificação ao gênero que mais se adequa a nossa percepção de gênero… Mas para tal, é preciso entendermos o que são Gêneros.
Na percepção “politicamente correta” do sistema, Gêneros, são papéis sociais que nos é atribuído ao nascermos com base ao órgão genital (Pênis ou Vagina) biólogico com o qual nascemos. Por esses papéis sociais carregarem normas, regras ou funções predefinidos que a sociedade acredita que vá de acordo a genitália dos indivíduos, os mesmos acabam sendo definidos por Homens ou Mulheres, Activo ou Passiva, por terem biologicamente Pênis e Vagina, sem darem oportunidade aos indivíduos de auto-definirem os Gêneros que mais se adequam a eles com base nas suas construçõs sociais.
Se essa oportunidade de auto-percepção fosse dada aos indivíduos, como iria ser definido por unanimidade a questão Gênero?
Com certeza seria:
“Gênero, são papéis sociais de ser e estar, definidas e entendidas com base na construção social de cada indivíduo. Ou seja, gênero é uma construção social que, a sua determinação é influenciada pelo meio socia ou, cultural em que o indivíduo se encontra”
Por mais que o sistema não tenha dado essa oportunidade, a definição mais justa e adequada acaba por ser essa.
Desse modo, podemos afirmar que, ser Mulher, Homem ou Queer é uma construção social… Pois reduzir a mulher e o homem ao orgão genital é sexista. Não é o orgão genital biológico do indivíduo que o torna homem ou mulher, é a sua construção social…
Mas por outro lado, temos que entender que, o Feminismo radical é necessário e importante, até mesmo para a nossa realidade social. Pois a mesma levanta problematicas e visões que nós não temos coragem de as debater e ver. Mas, é preciso contextualizar o mesmo com base a nossa realidade social, cultural e política, pois a linha de atuação do Feminismo Radical Europeu ou Americano não terá sustentabilidade e nem discutirá problemas realísticos se forem aplicadas tal e qual aqui em Angola.
(talvez as manas do Arquivo de Identidade Angolano e Paula Sebastião tenham mais embasamento para abordar esse ponto do que eu)
Então, o Feminismo e a causa LGBT lutam contra quem/o quê?
Até agora deu para perceber que, o Feminismo não surgiu para lutar contra um indivíduo ou um grupo de indivíduos em si. O Feminismo surgiu para lutar contra um sistema, contra o sistema Patriarcal. Sistema esse que favorece/privilegia um grupo de indivíduos em específico para continuarem a sustentar o mesmo. Indivíduos esses que segundo a nossa realidade social são Homens, Heterossexuais e Cisgêneros. Os tornando indivíduos isentos de sensibilidade e com a percepção de que estão acima de tudo e todos, sendo a mulher o seu instrumento de procriação e não merecedor de independência, e, todos os outros indivíduos que se assemelham a mesma são indignos e falhas da natureza, ou seja, Mulheres e os outros indivíduos Não Binários são os mais marginalizados e as maiores vítimas do sistema Patriarcal… Mas não é só esse grupo de indivíduos que sentem os privilégios desse mesmo sistema, homens Gays Cisgêneros em determinados momentos também sentem os benefícios desses privilégios… E é exatamente contra esse mesmo sistema que a Comunidade LGBTQIAP+ tem lutado, pois os mesmos também são vítimas diretas do sistema, apesar de cada causa carregar as suas particularidades.
Então, os nossos orgãos genitais biológicos são os factores que determinam a nossa posição de privilegiados (ou não) dentro do sistema Patriarcal? Ou, o que está em pauta é uma série de factores sociais, culturais e políticos que determinam isso?
No final do dia, até o homem do sistema, se torna vítima do mesmo, pois as suas caixinhas de exigências/normas se tornam impossíveis de serem alcançadas pelos mesmos.
Por: David Kanga
[…] vimos em outras situações, como no artigo Feminismo ou exterminação das pessoas com pénis, género é uma construção social. Construção social essa que, carrega toda uma serie de […]