Quando falamos do mercado de trabalho angolano pensamos sempre na escassez de oportunidades, exigência de anos de experiências, pouca mão de obra qualificada e fraca estimulação do mercado pelo governo local.
São nos momentos mais críticos que surgem as soluções mais inovadoras para atender os problemas que assolam as nossas comunidades, e o mercado de trabalho angolano tem sido invadido por essas, necessárias e urgentes, inovações protagonizadas por jovens impulsionados pelo avanço da tecnologia digital.
Nazaré Maria Vidal Quilulo, nascida em 8 de outubro de 1992, é uma empreendedora e Influencer de RH, que tem apresentado uma nova dinâmica no mercado trabalho angolano e nas acções filantrópicas a partir das redes sociais.
Com a alta demanda na procura de emprego por jovens, e a procura de investimentos para pequenos comerciantes, lutamos com a fraca disponibilidade de empregos nas empresas locais. Diante deste cenário, Naza Vidal tem impulsionado o mercado de recrutamento – capacitação técnica e estimulação no crescimento de pequenos comerciantes – angolano dentro das plataformas digitais com o projecto “Perfil de Oportunidades“.
Como começou o projecto Perfil de Oportunidades?
Eu me chamo Naza Vidal Quilulo! Nas redes sociais (Facebook) eu tenho dois perfis profissionais, o Naza Vidal Kilulo e o Naza da Mbonzo, e os dois eu uso na mesma dimensão para os trabalhos que eu tenho desenvolvido.
O projecto Perfil de Oportunidades surgiu em 2020, durante o auge da pandemia. Nesse período recebi muitos pedidos de ajuda, muita gente ficou sem emprego, muitos perderam os seus negócios, as empresas reduziram o seu pessoal, e diante deste cenário tive de fazer das dificuldades uma oportunidade. Foi daí que surgiu o Perfil de Oportunidades.
Fui em várias empresas, passei a enviar cartas de apresentação do meu perfil, e do projecto em si, e de parcerias, explicando qual era a minha intenção como recrutadora para as áreas que as empresas precisariam de preencher.
Entrei nas empresas, entrei nas escolas, entrei em tudo que era campo que eu vi que era de oportunidades para poder ajudar as pessoas. Comecei por ajudar as famílias carenciadas, levando oportunidades de negócios, alimentação e ajuda médica e medicamentosa, e isso foi se espalhando. As pessoas foram partilhando uns com os outros de que existe uma jovem que tem ajudado muito e tem feito muita coisa. O número de pedidos foi aumentando, a responsabilidade também, daí surgiu a necessidade de se criar mais links para atender a alta demanda.
Depois de teres começado a fornecer ajuda apenas de alimentação e saúde, tiveste de expandir o teu campo de actuação?
Sim (risos)! Eu costumo dizer que eu tenho links para tudo (risos)… Graças a Deus eu tenho bons parceiros, sempre que surge alguma situação eu já sei aonde me dirigir para conseguir a solução. Comunico e envolvo os meus parceiros, mostrando a vontade de ajudar com relação ao problema que me chegou. Nós já fomos em comunidades levar alimentos, visitamos famílias para atender as necessidades de renda e saúde, e atendemos também aos problemas de pessoas cadeirantes, arrecadando cadeiras e muletas para os mesmos… E como dar pão não é o mesmo que ensinar a fazer pão, surgiu a necessidade de criar uma rede de empregabilidade.
Ao invés da Naza dar apenas pão e arroz, o que pode acabar até amanhã, era preciso criar uma fonte de rendimento, aí surge a empregabilidade. O perfil de Oportunidades veio com as oportunidades de empregos. E, de lá para cá, graças a Deus, já conseguimos empregar muita gente… Todos os dias estamos a lutar para empregar mais pessoas.
Então, o Perfil de Oportunidades é uma plataforma de recrutamento que facilita e simplifica o processo de recrutamento das empresas com os candidatos?
Sim! Porque as empresas hoje não querem o trabalho do processo de recrutamento, eles têm muita coisa para fazer e produzir. Daí, tem o Perfil de Oportunidades para fazer esse processo, analisar os processos de candidaturas, selecionar os que mais se adequam para as vagas, e enviar para as entrevistas nas respectivas empresas.
As empresas já sabem que existe o Perfil de Oportunidades, eles chegam e dizem o número de vagas que têm, com as respectivas áreas, eu e o meu pessoal fazemos o anúncio e a avaliação das candidaturas. Depois da primeira selecção e entrevista, enviamos os candidatos selecionados para a segunda entrevista, já na empresa que nos solicitou, de seguida a empresa nos comunica que dos candidatos que enviamos, eles ficarão com `X e Y´ porque preenchem os requisitos que eles realmente procuram.
Quais foram as barreiras que enfrentaste ao longo desses quase 5 anos?
Barreiras, no verdadeiro sentido da palavra, eu não enfrentei. E isso é sobre posicionamento!
Eu sou uma pessoa muito segura e eu sei o que quero. Isso é mesmo sobre posicionamento. A pessoa tem que se impor para ter o respeito que merece… Eu não digo que tive barreiras, eu sou uma pessoa de fácil trato e as instituições parceiras me veem como uma boa parceira que podem contar. Os comentários de insatisfação é normal que surjam, porque quando as pessoas estão acostumadas a receber e nunca a dar, isso cria o tumulto.
A minha ideia é gerar e criar oportunidades. Eu quero que daqui a dois ou três anos, quando eu não poder mais fazer – porque as oportunidades não são para sempre, porque a Naza de hoje, pode não ser a Naza de amanhã –, possa surgir uma outra pessoa com uma ideia mais relevante ainda, e isso é normal que aconteça. E gostaria muito que depois de um tempo as pessoas pudessem dizer “esse projecto existe porque a senhora Naza criou”… As coisas têm que ter pés, não podem ficar estáticas.
Naza é de longe uma das maiores influencers digitais em Angola dentro da sua área de actuação. O trabalho social e económico de Naza tem furado a bolha das redes sociais, para 2025, a Influercer de RH estará a levar a dinâmica do Perfil de Oportunidades para a televisão angolana no “Programa da Blindada”, com a rubrica Janela de Oportunidades, transmitido pelo canal público, TV Zimbo.
O que a motivou a incluir as oportunidades de profissionalização no seu projecto?
Eu percebi que uma boa parte das pessoas que procuravam por empregos não tinham as capacidades técnicas para ocuparem os cargos que as empresas precisavam. Daí surgiu a ideia de ir atrás de centros de formação profissional, lançar o desafio aos centros de formação… Dessa iniciativa surgiu às parcerias com o MAPTESS, CINFOTEC, CRIARTE… E conseguimos pôr mais de 500 pessoas a se formarem no Maptess e no Cinfotec a custo zero.
Quais são as formações que o pessoal mais tem aderido?
Todas possíveis (risos)!
Qual é a faixa etária das pessoas que mais têm aderido as oportunidades do Perfil de Oportunidades?
Nós temos recebido pessoal de todas as idades, graças a Deus… Desde aos adolescentes até às pessoas com mais de 60 anos.
E diante deste cenário, percebemos que a tua vida profissional fala bem mais alto que a tua vida pessoal ou amorosa, mesmo sendo uma pessoa Queer…
Isso acontece porque eu tive de me impor… Eu sempre deixei bem claro que ao falar da Naza não é sobre a Naza namorada, mulher, esposa ou mãe de alguém, não. A Naza que a sociedade no geral conhece, é a Naza profissional, é a Naza influencer, é a Naza facilitadora de empregos e formações para quem está a precisar. Em alguns momentos quando tu dás espaço para as pessoas entrarem na tua vida pessoal, aquilo que é o teu eu profissional se ofusca.
Não é que eu não possa falar sobre mim, mas, em que momento? Aonde nós estamos? Qual é a visão que eu quero passar para os meus parceiros quando se fala da Naza? É a Naza profissional, é a Naza solidária, é a Naza da filantropia… É essa Naza que eu dei para as pessoas conhecerem e é essa Naza que as pessoas devem conhecer e contactar…
Consideras-te uma Digital Influencer ou acreditas que essa categoria é limitante para o que tu fazes?
Bem… Eu sou uma pessoa influente, e por trabalhar no digital e fazer com que tudo aconteça no digital então, sim, eu sou uma Digital Influencer.
Qual é a tua opinião acerca do actual cenário digital angolano e os seus influencers?
Eu acredito que cada um deve dar aquilo que tem. Não podemos exigir que as pessoas nos deem uma coisa que elas não têm capacidades para dar… Eu oiço muito o termo Influencer, mas, eu conheço e acompanho poucos Influencers.
Tem pessoas que são realmente Digital Influencers, que influenciam no verdadeiro sentido da palavra. Se eu tenho a capacidade para mudar, moldar e ajudar a sociedade a crescer em virtude daquilo que é a minha influência, por quê não usar?
Quando percebi que eu era uma Naza que o digital recebeu bem, eu mudei completamente a minha utilidade no virtual. Deixei de ser a Naza que posta memes, deixei de ser a Naza que só fica na internet durante 24 horas a ver futilidades e, passei a ser Naza que criou o Perfil de Oportunidades.
Quem tem influência no digital e nada faz para mudar, de maneira positiva, a vida das pessoas, e até mesmo a vida dela, não devia se considerar Influencer.
Desde o início do ano de 2024 até a presente data, quantas pessoas conseguiram ser empregadas pelo Perfil de Oportunidades?
(risos) um exemplo, nessa último semana conseguimos empregar 20 pessoas… Na semana antes dessa empregamos 47… Hoje, estamos para empregar mais 3 pessoas. Assim que terminarmos a entrevista, terei um encontro com alguns parceiros para podermos disponibilizar 20 vagas de formação de Inglês, 20 para o curso de Oratória e duas Bolsas de estudo para o Ensino Médio e Primário… Todos os dias que acordo estamos sempre a empregar.
Imagina! Eu, há uns dias fui para um restaurante jantar, onde todas pessoas que trabalham lá, foram empregadas pelo Perfil de Oportunidades. Quando cheguei lá, todos ficaram assustados porque nunca tinham me visto antes pessoalmente, e no meu caso era a mesma coisa… Um pormenor, o pessoal que nós empregamos na maior parte das vezes não chegam de conhecer-me pessoalmente… No meio do jantar, um deles chegou na nossa mesa para agradecer por termos ajudado o mesmo a conseguir o emprego, depois recebemos uma refeição oferecida pelo cozinheiro em forma de agradecimento por também ter conseguido o emprego pelo Perfil de Oportunidades. E isso, realmente me deixou muito feliz… Isso significa que estamos a fazer um bom trabalho e a ideia é continuar.
Temos de entender que se o governo e o privado (empresas) não têm, nós, pessoas singulares, podemos criar formas de sustentabilidade…
Sempre que eu recebo pedidos de emprego, eu pergunto “tu és bom/a em quê?”, muitos chegam a dizer “eu me adapto”. Não, as empresas não querem alguém que se adapte, tu tens de ser a pessoa que é boa naquilo que a empresa está a procura. Tu tens de ser a pessoa que quando for na empresa é para acrescentar.
Tu ficas 5 anos na universidade, procuras emprego e te pedem 5 anos de experiência. Quando pedem experiência, não é sobre trabalhar no estado ou em alguma empresa privada renomada. É sobre ter experiência no mercado de trabalho independentemente da área, ter um histórico.
Quando eu ainda estudava, eu trabalhei como assistente de lar (empregada doméstica) em casa do namorado da minha amiga. E eu trabalhei, porque eu precisava pagar a minha universidade e eu precisava conhecer o trabalho. A experiência é extremamente importante.
Além do Perfil de Oportunidades, tens mais algum ofício?
Eu sou empreendedora! Tenho uma empresa de prestação de serviços no ramo da culinária e também vendo pincho em casa (risos)… É sempre juntar o útil ao agradável.
Como a Naza se vê daqui a dois anos?
Rica (risos)! Daqui a dois anos serei rica. Estamos a trabalhar para isso, e o Perfil de Oportunidades será aquele instituição que até o governo terá como parceiro… Essa é a meta!